Aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver com os outros e aprender a ser - uma visão integral da educação.
Uma boa forma de pensarmos o desenvolvimento socioemocional é fazê-lo a partir dos 4 pilares da educação baseados no relatório da Unesco proposto pela Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI coordenada por Jacques Delors. A referência aqui é a aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver com os outros e aprender a ser.
De imediato, podemos afirmar que, ao considerarmos esses aspectos mencionados, somos remetidos a uma visão integral da educação. Nessa perspectiva, somos convidados a ultrapassar o limite de uma visão educativa puramente conteudista ou que privilegie única e exclusivamente a dimensão cognitiva do processo ensino-aprendizagem. Muito mais do que isso, trata-se de uma forma de pensar o mundo e as relações interpessoais.
APRENDER A CONHECER
Assim, quando nos preocupamos com o desenvolvimento socioemocional somos levados a considerar como é fundamental aprender a conhecer. Não se trata apenas de incentivar o estudante a adquirir um repertório de saberes codificados, mas de ser capaz de dominar os próprios instrumentos do conhecimento.
Um bom ponto de partida para que isso se faça realidade é ajudar cada estudante a descobrir o imenso prazer que é aprender, chegar à consciência de como é importante ampliar a sua capacidade de compreensão, de perceber que ele também não só pode como deve contribuir para a construção do próprio conhecimento.
É nesse sentido que, quem se sente educador na acepção plena do termo, tem como compromisso vital estimular um interesse cada vez maior na busca de informações fidedignas, especialmente considerando que no jogo do poder político em vários países, a mentira e a difamação passou a ser usada como estratégia para a busca ou a manutenção do poder.
Uma das consequências mais imediatas disso é promover a libertação da ignorância, na medida em que haja interesse real em superar as confusões propostas por narrativas fortemente ideologizadas, que tentam impedir que haja uma compreensão objetiva da realidade. Há aqui um peso maior sobre o raciocínio lógico, dedução, memória ou, em outras palavras, dos processos cognitivos.
No entanto, pensando em termos de uma educação integral, é fundamental que o estudante compreenda que sua relação com o conhecimento não subsiste apenas na condição passiva de quem somente se apropria do que já foi feito ou do que já está posto, mas despertá-lo para que possa contribuir para o desenvolvimento das diversas formas de conhecer, se comprometendo sempre mais e melhor em ter vontade de aprender, a querer saber sempre mais.
Agindo assim, ele ou ela certamente poderá exercitar melhor a sua atenção, aprimorar a sua memória e, é claro, pensar de modo mais crítico, com maior discernimento, possibilitando que venha, de modo incisivo, a tomar as melhores decisões.
APRENDER A FAZER
O desenvolvimento socioemocional também nos conduz a aprender a fazer. O desafio aqui é encontrar a ponte que leva do conhecimento teórico para o mundo da pratica.
É esse exercício que permite ao ser humano lidar melhor com a situações de emprego, como agir de modo cooperativo, a entender melhor o desenvolvimento corporativo. É colocar o estudante em contato com os valores que regem o mundo do trabalho. Esse saber fazer é um pilar ainda mais essencial, especialmente nesses dias do alvorecer do terceiro milênio em que vivendo em sociedades assalariadas verificamos a necessidade de mão de obra com um nível de especialização crescente em tarefas mais intelectuais ou mentais, tendo em vista a concorrência cada vez maior das máquinas.
É preciso saber fazer e saber por que se faz de um jeito e não de outro. Não se pode esquecer que estamos vivendo uma época de um tipo de trabalho que ganha, em diversas situações, a característica da desmaterialização, indo muito mais além do que passar a vida inteira colocando um parafuso sempre no mesmo lugar durante anos a fio. Exige-se cada vez mais que os trabalhadores desenvolvam técnicas outras além do simples fazer puramente técnico. Espera-se hoje que haja boa capacidade de comunicação, que haja boa disposição para trabalhar com outros, que seja capaz de gerenciar e resolver conflitos.
APRENDER A VIVER COM OS OUTROS
O desenvolvimento socioemocional se torna ainda mais necessário quando pensamos em termos de aprender viver com os outros. Aqui transita-se pelo mundo das atitudes e dos valores. É aqui que se fala de enfrentamento de conflitos, da não aceitação de preconceitos, de uma educação que se volte efetivamente para a paz, para o exercício da tolerância... É por isso mesmo que esse relatório, que foi elaborado para a Unesco, enfatiza a “descoberta progressiva do outro” pois, na medida em que compreendemos mais os que nos cercam, via de regra, criamos uma possibilidade maior de combatermos as ideias preconcebidas que, em algum momento, tenhamos nutrido com relação aos que são diferentes de nós mesmos.
Outros espaços de aproximação podem surgir quando, por exemplo, participamos uns com os outros em projetos comuns, diluindo atritos, derrubando muros e, em alguns casos muito desejáveis, criando pontes muito sólidas. E, é claro, se estamos comprometidos, como educadores, em transmitir conhecimentos que valorizem a diversidade humana, abrimos janelas de conscientização sobre as semelhanças. E não somente isso, mas descobrimos em que medida, como seres humanos, somos interdependentes com relação aos outros cidadãos dessa terra.
APRENDER A SER
O desenvolvimento socioemocional é básico quando pensamos em termos de aprender a ser. É finalidade de um projeto educacional que seja integral buscar o desenvolvimento total do indivíduo: espírito e corpo, sentido estético, responsabilidade pessoal e espiritualidade.
Para alguém que conseguiu entender o quanto é importante aprender a conhecer, o quanto podemos transformar a realidade aprendendo a fazer, o quanto podemos ser muito mais eficazes quando descobrimos que 'juntos somos mais', então nossa possibilidade de crescimento como pessoas, como indivíduos, aumenta muito mais.
É esse o caminho de uma cidadania autônoma. Indivíduos autônomos não são, definitivamente, os que pensam somente em si mesmos, os que abrigam em si egos gigantescos, os que adoram espelhos para poderem mergulhar o tempo todo em um auto culto narcísico. A autonomia, ao contrário, é a possibilidade de cada pessoa poder se auto conduzir, ser capaz de fazer escolhas, ser capaz de dialogar, de ouvir, de se colocar – por decisão própria – ao lado de todos os que desejam caminhar ao seu lado.
Dessa maneira, a educação vista em uma perspectiva integral tem um papel essencial. Para que algo assim se transforme em realidade, é muito importante investir em desenvolvimento socioemocional. É preciso garantir a todos os cidadãos liberdade de pensar com discernimento, de modo construtivo, fazendo as sementes dos talentos brotarem de tal modo a poderem realizar todo o seu potencial, com imaginação e criatividade. Gente capaz de iniciativa, gente disruptiva que inova, gente capaz de conduzir o destino de sua vida e de sua história. Gente que aprendeu a conhecer, que aprendeu a fazer, que aprendeu a viver com os outros, que aprendeu a ser...
Dr. Rubens Eduardo Cordeiro
Capelão Geral da Rede Batista de Educação
Comments