O fortalecimento da identidade das escolas confessionais.
Por Luciano Sathler
É cada vez menor a proporção de crianças e adolescentes na população brasileira. A redução do número de matrículas nas escolas públicas parece acompanhar essa tendência demográfica. Por outro lado, a quantidade de estudantes nas escolas privadas têm crescido, provavelmente um sinal de que as famílias optam por investir mais na formação dos educandos quando há um maior poder de compra em suas mãos.
De acordo com o IBGE, em 2012, o país tinha 193.946.886 habitantes, sendo que 48.486.722 estavam na faixa etária de 5 a 19 anos.
Em 2022, o Brasil chegou aos 203.062.512 habitantes, dos quais apenas 42.643.127 tinham de 5 a 19 anos de idade. É uma queda significativa, tanto em termos da proporção na população quanto dos números absolutos das crianças e adolescentes.
Essa mudança da pirâmide demográfica foi fortemente sentida nas escolas públicas, que tiveram uma queda significativa no número de matrículas. Eram quase 40 milhões de estudantes nessa categoria administrativa, em 2010; já em 2022 somaram pouco mais de 38 milhões de alunos.
Enquanto isso, as escolas privadas tinham, em 2010, quase 7 milhões de matrículas; e chegaram a mais de 9 milhões de estudantes, em 2022.
Vale destacar que a Educação Profissional chegou a 906.763 alunos em escolas privadas, um crescimento expressivo nos últimos anos. Também há o fenômeno de vários convênios do Poder Público para abrir matrículas na Educação Infantil em parcerias com mantenedoras.
São variadas as razões que levam uma família a se comprometer com uma mensalidade escolar.
No caso das escolas confessionais, além dos fatores normais que levam à decisão das famílias – qualidade, localização, infraestrutura, preço e atendimento -, chama a atenção o desenvolvimento da espiritualidade e dos valores éticos focados no bem comum.
A espiritualidade é um conceito de difícil definição. Quem chegou ao topo de uma montanha, ficou fascinado com alguma obra de arte ou mesmo em oração, quando sentiu aquela sensação avassaladora de grandeza e pequenez ao mesmo tempo, a grandiosidade da existência, o milagre e a fragilidade de ser humano percebe um chamado para sair da apatia espiritual.
Cada cultura tem uma resposta diferente para o desenvolvimento espiritual. No caso das escolas cristãs, a fundamentação está sempre em Jesus Cristo, na Bíblia e na tradição que marca a história de uma igreja, daí o termo confessional – que confessa sua vinculação a uma instituição que proclama a sua cosmovisão a partir de uma experiência situada no tempo, no espaço e na história, geralmente de uma beleza que inspira a adesão aos valores dos fundadores.
Uma grande novidade nesse sentido é que as neurotecnologias hoje permitem que a Psicologia e a neurociência possam afirmar que a espiritualidade é uma característica inata do ser humano. Ou seja, nascemos geneticamente programados para desenvolver uma vida espiritual.
E que as crianças que são criadas com uma vida espiritual robusta e bem desenvolvida são mais felizes, mais otimistas, mais prósperas, mais flexíveis e mais bem equipadas lidar com os traumas comuns - e até extraordinários -, da vida do que aquelas que não o são.
Os adolescentes, em particular, ficam exponencialmente em melhor situação se estiverem em contato com o seu lado espiritual – menos propensos a abusar de álcool, drogas, a terem comportamentos inconsequentes e lidam melhor com a depressão.
Além disso, pesquisas apontam a enorme desvantagem de continuar a negligenciar o desenvolvimento espiritual dos filhos. O atrofiamento espiritual talvez possa prejudicar uma criança para sempre, criando um frágil senso de identidade e falta de resiliência.
Podemos ver a crise em formação quando o desenvolvimento espiritual é negligenciado ou quando a curiosidade e exploração espiritual individual de uma criança é negada.
Numa sociedade sem sentido, onde as vidas caminham muitas vezes sem um significado e sem esperança, as crianças imbuídas de espiritualidade tornam-se adultos que podem contar as suas bênçãos, sentir uma vocação no seu trabalho, considerar as relações humanas como sagradas e podem ver os infortúnios como oportunidades.
Muitas das coisas que as crianças fazem são naturalmente espirituais: elas podem olhar para as formigas num formigueiro durante horas. Isso é atenção plena. Eles sentem uma sensação de desespero quando veem um sem-teto. Isso é compaixão ou misericórdia. As crianças do ensino fundamental estão profundamente preocupadas com a imparcialidade ou justiça e sentem-se estimuladas ao ajudar outras pessoas. Isso é caridade. A tradição judaico-cristã há muito ensina que o amor dos pais pelos filhos é uma metáfora da forma como Deus ama as pessoas.
Na infância e na adolescência a abertura para o diálogo é essencial para o desenvolvimento da espiritualidade. É preciso ir além dos dogmas, dos símbolos, dos discursos estéreis muito centrados em práticas medievais que não fazem sentido se não forem ressignificados.
Para colaborar com o desenvolvimento espiritual do outro é preciso viver a espiritualidade como um princípio norteador profundo, que molda pensamentos, atitudes e comportamentos.
Ter um olhar para o Alto que ajuda a revelar a nossa própria pequenez e ensina que a humildade é o princípio para aprender com a transcendência. E uma atenção que move em direção ao outro, ao próximo, compaixão mobilizadora especialmente em benefício dos mais fragilizados, empobrecidos e sofridos.
Há crianças e adolescentes cujas famílias estão equilibradas financeiramente, mas onde se observa uma profunda pobreza nos afetos. Há espaço para anunciar e testemunhar o amor ao próximo em todas as classes sociais.
Luciano Sathler
Membro do Conselho Estadual de Educação de Minas Gerais e do Conselho Deliberativo do CNPq. CEO da edtech CertifikEDU Microcertificações com Blockchain e Inteligência Artificial, focada na visibilização de competências desenvolvidas a partir dos itinerários formativos e projetos de vida do Ensino Médio / Ensino Técnico
http://blog.certifikedu.com.
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